âđŸ Introdução
A lĂngua portuguesa, alĂ©m de veĂculo cultural e meio de expressĂŁo quotidiana, assume tambĂ©m um papel jurĂdico e institucional de suma importĂąncia. Em Angola, como nos demais paĂses lusĂłfonos, o portuguĂȘs Ă© a lĂngua oficial utilizada em documentos legais, administrativos e governamentais. No entanto, a questĂŁo da ortografia nesses documentos suscita dĂșvidas e debates, sobretudo no que diz respeito Ă adoção ou rejeição do Acordo OrtogrĂĄfico de 1990.
Nesta aula, exploraremos como a lĂngua portuguesa Ă© aplicada na documentação oficial em Angola, examinando os padrĂ”es ortogrĂĄficos, a coerĂȘncia institucional, os desafios da uniformização e as prĂĄticas emergentes.
đ 1. O PortuguĂȘs em Documentos Oficiais Angolanos
Em Angola, a Constituição da RepĂșblica, leis, decretos, portarias, relatĂłrios ministeriais, comunicados oficiais, circulares e outros documentos administrativos sĂŁo redigidos exclusivamente em portuguĂȘs. No entanto, a norma ortogrĂĄfica utilizada ainda se baseia, em grande parte, nas regras anteriores ao Acordo OrtogrĂĄfico de 1990.
CaracterĂsticas mais comuns nos documentos oficiais:
- Uso de grafias como âacçãoâ, âprojectoâ, âobjectivoâ.
- Manutenção de consoantes mudas: âbaptismoâ, ârecepçãoâ.
- HĂfen utilizado com as regras tradicionais: âauto-estradaâ, âvice-presidenteâ.
- Uso residual de termos com letras K, W e Y, principalmente em nomes prĂłprios ou estrangeirismos.
đ 2. Tabela Comparativa: Presença OrtogrĂĄfica nos Documentos Oficiais (Angola vs. CPLP)
Elemento OrtogrĂĄfico |
Angola (2024) |
Portugal (2024) |
Brasil (2024) |
Consoantes mudas |
â Mantidas |
â Eliminadas |
â Eliminadas |
Novo uso do hĂfen |
â NĂŁo aplicado |
â Aplicado |
â Aplicado |
Acordo OrtogrĂĄfico de 1990 |
â NĂŁo ratificado |
â Aplicado |
â Aplicado |
VocabulĂĄrio comum |
Parcialmente |
Estabilizado |
Estabilizado |
Padronização nos manuais escolares |
Mista (nova e antiga) |
Uniforme |
Uniforme |
âčïž Fonte: Dados recolhidos a partir de manuais jurĂdicos, publicaçÔes legislativas e instituiçÔes pĂșblicas da CPLP (2024).
đ§Ÿ 3. Casos PrĂĄticos em Angola
Exemplo 1 â DiĂĄrio da RepĂșblica (Publicação Oficial)
“O presente Decreto-Lei entra em vigor Ă data da sua publicação, sendo aplicĂĄvel a todos os projectos de infra-estrutura submetidos Ă Direcção Nacional de Urbanismo e Habitação.”
đ Observa-se:
- Uso de âprojectosâ (com c).
- Terminologia jurĂdica estĂĄvel e tradicional.
Exemplo 2 â Despacho Ministerial
“A Direcção da Escola Ă© responsĂĄvel pela recepção de todo o equipamento electrĂłnico, devendo remeter o relatĂłrio atĂ© 10 dias Ășteis apĂłs a sua entrega.”
đ Observa-se:
- Uso de ârecepçãoâ (com p).
- Grafia tradicional predominante.
đ 4. Desafios da Padronização OrtogrĂĄfica em Angola
Principais obstĂĄculos:
- Falta de legislação oficial sobre a adoção do Acordo Ortogråfico de 1990.
- Materiais escolares e jurĂdicos dĂspares, com grafias ora tradicionais, ora modernizadas.
- Falta de formação técnica em revisão de texto segundo normas actualizadas.
- ResistĂȘncia cultural e institucional Ă mudança ortogrĂĄfica.
đ 5. RecomendaçÔes AcadĂ©micas e Governamentais
Para promover uma maior coerĂȘncia na produção de documentos oficiais em Angola, propĂ”em-se as seguintes linhas de acção:
- đ Criação de um Guia de Redação Oficial Angolano, com normas ortogrĂĄficas adaptadas Ă realidade nacional.
- đ Capacitação de funcionĂĄrios pĂșblicos e revisores, especialmente na ĂĄrea jurĂdica e legislativa.
- đ€ Coordenação com a Academia Angolana de Letras e instituiçÔes linguĂsticas dos PALOP.
- đïž Consulta pĂșblica sobre a ratificação ou adaptação prĂłpria do Acordo OrtogrĂĄfico, considerando os contextos culturais e educacionais de Angola.
â ConclusĂŁo
A norma ortogrĂĄfica utilizada nos documentos oficiais Ă© um reflexo nĂŁo apenas da estrutura linguĂstica, mas tambĂ©m da identidade nacional e da soberania cultural. Angola, enquanto nação independente, tem o direito e a responsabilidade de definir o padrĂŁo ortogrĂĄfico que melhor representa a sua realidade â quer opte por manter o modelo europeu, quer por adaptar-se a uma norma lusĂłfona comum.
O importante Ă© que essa escolha seja informada, discutida e democraticamente implementada, garantindo ao mesmo tempo clareza, unidade e funcionalidade nos textos oficiais do paĂs.