✒️ Uma Ortografia Partilhada, Múltiplas Realidades
A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) é composta por nações que, embora unidas pelo idioma, expressam-no de maneiras diversas, enriquecidas por suas histórias, culturas e contextos sociopolíticos. Com o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, surgiu o anseio de aproximar essas variações num modelo ortográfico comum — um passo ambicioso e estratégico rumo à coesão linguística internacional.
Nesta aula, examinaremos os impactos reais da nova ortografia nos países da CPLP, destacando os avanços, resistências e implicações práticas, especialmente sob a óptica angolana.
📚 1. Objectivos do Acordo: Um Breve Enquadramento
O Acordo Ortográfico de 1990 foi concebido para:
- Eliminar divergências ortográficas entre os países lusófonos;
- Criar uma base unificada para dicionários, livros didácticos e publicações oficiais;
- Aumentar a visibilidade internacional do português, posicionando-o como língua de trabalho nas organizações multilaterais;
- Reduzir os custos e as duplicações na produção de conteúdos escritos.
Contudo, o impacto desse acordo não foi homogéneo, refletindo diferentes graus de adesão e aplicação, como veremos a seguir.
📊 Gráfico: Grau de Adesão ao Acordo Ortográfico (2025)
🌍 2. Panorama da Aplicação nos Países da CPLP
País |
Adesão ao Acordo |
Grau de Aplicação |
Observações Relevantes |
Brasil |
Sim (2009) |
Total |
Adaptação ampla em escolas, mídia e literatura. |
Portugal |
Sim (2009) |
Ampla |
Adopção oficial em órgãos públicos e editoras. |
Angola |
Não (em discussão) |
Parcial e limitada |
Debate contínuo. Uso facultativo em escolas. |
Moçambique |
Não (em discussão) |
Parcial |
Resistência académica. Aplicação selectiva. |
Cabo Verde |
Sim |
Moderada |
Em transição, com apoio do governo. |
Guiné-Bissau |
Sim |
Fraca |
Dificuldade de implementação efectiva. |
São Tomé e Príncipe |
Sim |
Significativa |
Aplicado em manuais escolares e documentos. |
Timor-Leste |
Sim |
Moderada |
Adopção com apoio internacional. |
🇦🇴 3. Angola: Entre a Soberania Linguística e a Cooperação
Em Angola, a questão ortográfica está profundamente ligada à identidade nacional. O país adopta, de forma não oficial, o português europeu com traços específicos do uso local. A adesão ao Acordo Ortográfico ainda está em análise por órgãos como a Academia Angolana de Letras e o Ministério da Educação.
Os principais impactos em Angola incluem:
- Educação: dificuldades de unificação nos currículos escolares; livros chegam com grafias divergentes (ex: ação vs acção).
- Edição de livros: editoras nacionais precisam escolher entre a norma europeia tradicional e a nova ortografia.
- Administração pública: documentos oficiais mantêm a ortografia antiga, criando descompassos com instituições internacionais.
- Tecnologia e comunicação: softwares de correção ortográfica e plataformas digitais muitas vezes seguem o Acordo, influenciando gradualmente o uso linguístico.
📊 4. Gráfico: Grau de Aceitação do Acordo pela População Docente (estimativa)
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✍🏾 5. Reflexão Crítica: Uma Ortografia para Todos?
A unificação ortográfica propõe-se como uma ponte entre povos, mas nem sempre considera a paisagem linguística de cada margem. Em Angola, onde o português convive com línguas nacionais como o kimbundu, umbundu, kikongo e tchokwe, a ortografia precisa ser funcional, mas também culturalmente respeitosa.
A imposição de uma norma ortográfica que não dialoga com a realidade sociolinguística local pode criar resistências, marginalizar variantes e até distanciar o falante da língua que se pretende promover. Portanto, qualquer mudança precisa ser participativa, pedagógica e progressiva.
✅ Conclusão
O Acordo Ortográfico tem impactos distintos nos países da CPLP. Em alguns, promoveu maior uniformidade e dinamismo editorial. Em outros, como Angola, impôs o desafio de harmonizar a tradição linguística com as exigências da modernidade.
Angola tem diante de si a oportunidade de liderar uma reflexão africana sobre a ortografia do português, afirmando a sua variante como válida, legítima e parte da construção colectiva da língua portuguesa no século XXI.